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Hipotireidismo Subclínico – um novo desafio?

A endocrinopatia (disfunção endócrina) mais comum em toda a Humanidade é o mau funcionamento da glândula Tireóide. Seja trabalhando em excesso – Hipertireoidismo (quando os hormônios tireoideanos estão acima do limite superior da normalidade para sua idade, fazendo que o metabolismo seja “acelerado”) (Feedback, Maio/2018) ou trabalhando pouco, Hipotireoidismo (os hormônios tireoideanos estão abaixo do limite inferior da normalidade para sua idade, o que “diminui” a velocidade do metabolismo) (Feed-Back, Agosto/ 2015).

Para que a Tireóide funcione adequadamente, precisa ser estimulada pelo Hormônio Estimulante da Tireóide, o TSH (do inglês Thyrotropin-­‐ Stimulating Hormone) produzido pela glândula Hipófise (fig 1).

Os hormônios tireoideanos são o T4 Livre (Tiroxina) e T3 (triiodotironina) e são as formas ativas, responsáveis por reações vitais ao nível das células dos órgãos e sistemas do nosso corpo.

A Tireóide é um órgão que se situa na face anterior do pescoço, metade inferior (fig.1) que, quando aumentada de tamanho, torna-­‐se visível (bócio).  A glândula Tireóide, no entanto, pode estar “doente” e não apresentar nenhuma modificação, ou seja: bócio não é uma alteração que sempre aparece quando há alterações de seu funcionamento.

O Hipotireoidismo (quando o T4Livre está baixo) é o problema mais comum, tanto na infância como nas demais faixas etárias, podendo se manifestar no recém-­‐nascido – recebendo o nome de Hipotireoidismo  congênito, ou em qualquer etapa da vida, aumentando sua frequência à medida que a pessoa vai envelhecendo – chamado simplesmente de Hipotireoidismo. É importante salientar que as disfunções tireoideanas atingem ambos os sexos, e causam sinais e sintomas diferentes, conforme a etapa da vida em que a pessoa está: fase de crescimento, desenvolvimento  e  maturação  sexual  (recém-­‐nascido,  criança maior, adolescente), fase adulta, mulher gestante, idoso…

Com o aperfeiçoamento dos métodos de pesquisa para determinação dos valores circulantes dos hormônios, surgiu nas últimas décadas o conceito de Hipotireidismo Subclínico (HSC). Diagnosticado quando os níveis circulantes dos hormônios T4 livre e T3 estão dentro da normalidade, mas o TSH (Hormônio estimulante da Tireoide) está levemente aumentado (maior que 5,5µUI/l e menor que 10 µUI/l) ou com aumento mais severo (TSH maior que 10µUI/l) sem apresentar nenhum sintoma. É, portanto, um diagnóstico bioquímico, laboratorial.

O HSC pode ser um achado ocasional, pois, por definição, não apresenta os sinais do Hipotireoidismo. A criança, por exemplo, não apresenta os sinais clássicos: constipação intestinal, pele e cabelos secos, sono em excesso, “preguiça para mamar”, atraso no desenvolvimento neuro-­‐motor e psico-­‐social, e crescimento lento. Por outro lado, além de não apresentar sinais evidentes da doença Hipotireoidismo, a criança segue crescendo bem, com desenvolvimento neuropsicomotor e social dentro da normalidade, e/ou, na idade pré-­‐adolescente e adolescente evolui adequadamente tanto em crescimento físico, maturação, quanto motor e intelectual.

Em um estudo de seguimento de recém-­‐nascidos, crianças e adolescentes (total de 121.052) que tinham o TSH levemente aumentado foi observada a normalização do TSH na grande maioria das crianças (73,6%) e nos casos levemente alterados houve tendência à normalização em 5 anos, e aqueles com aumento mais severo (maior que 10µUI/l), observou-­‐se normalização em 40%, quando testados 5 anos após ( Lazarus et al).

O Hipotireoidismo Sub-­‐Clínico tem sido associado à Tireoidite linfocítica aguda (Tireoidite de Hashimoto), processo infeccioso que é a causa mais comum da diminuição da produção dos hormônios tireoideanos pós nascimento. O HSC poderá evoluir para o Hipotireoidismo clínico (quando se observam os sinais e sintomas descritos acima), vindo a necessitar de tratamento medicamentoso.

Outras causas têm sido associadas ao HSC, como irradiação, inadequado tratamento do Hipotireoidismo (omissão da ingestão da Levotiroxina ou dose inadequada ou, ainda, interação com outros medicamentos), Síndrome de Down, Síndrome de Turner, Hipotireoidismo central com comprometimento da bioatividade do TSH, Mutações do gen do receptor do TSH, entre outras.

Finalizando, diante deste diagnóstico, há necessidade de criteriosa investigação, considerando a gama de possíveis causas e instituição imediata de seu tratamento, quando diagnosticado, considerando o risco de a criança, adolescente, adulto ou o idoso se tornar hipotireoideo e não ser tratado a tempo.

Embora muitos casos representem anormalidades transitórias, uma parte dos casos de HSC persiste. Por isso o paciente (principalmente criança e adolescente) deverá ser seguido de perto, com avaliações clínicas e laboratoriais periódicos, para, caso necessário, ser tratado, pois até o momento, segundo a literatura, não existe um marcador que possa sinalizar qual será a evolução do processo.

Ref.bibliográficas: 2014 European Thyroid Association Guidlines for Mangement of Subclinical Hypothyroidism in Pregnancy an Children. Lazarus J et al.