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Crianças com problemas de adultos

Crianças com problemas de adultos (obesidade/diabetes tipo 2)

A população pediátrica e de adolescentes obesos ou com sobrepeso aumentou bastante em nosso país, fenômeno que em países anglo-saxões já é descrita como epidemia, mas os países em desenvolvimento, em especial o Brasil, se aproximam rapidamente à essa tendência.

O sedentarismo similar a um adulto, “o metabolismo de um adulto”

O ganho exagerado de peso é resultante de vários fatores, tais como o ambiente, história familiar, o metabolismo (forma com que o corpo transforma a alimentação e o oxigênio em energia), comportamento alimentar e o tempo dedicado à alguma atividade física.

Como se identifica?

Atualmente, o método mais usado universalmente é o índice da massa corporal (IMC), cuja fórmula é o peso dividido pela altura 2 (em metros). A interpretação dos valores para criança e adolescente são diferentes daqueles dos adultos. Nestes, o número resultante do cálculo já classifica o estado nutricional (ex: peso saudável de 18,5 a 24,9). As pessoas de modo geral já estão habituadas com o IMC, cabendo alertar que que nas crianças e adolescentes (2 a 19 anos), além do peso e altura deve-se considerar a idade e o sexo. Outra medida importante é a medida da circunferência abdominal (Fig.1).

Qual a importância do diagnóstico de sobrepeso e obesidade?

A obesidade na criança e no adolescente traz efeitos adversos à saúde e bem estar, tanto a curto, quanto a longo prazo. Entre uma longa série de doenças secundárias à obesidade, a curto prazo ou imediatos, é mais frequente ocorrer: hipertensão, Colesterol Total e Colesterol LDL (mau) elevados, Colesterol HDL (bom) baixo; problemas articulares e ósseos; apnéia do sono, e problemas psicossociais tais como a estigmatização e “bulling”, e ainda baixa auto estima, as crianças e adolescentes obesos correm maior risco de se tornarem pré-diabéticos, e, consequentemente, alto risco de se tornarem diabéticos.

A longo prazo, as crianças e adolescentes que são obesos têm mais possibilidades de se tornarem adultos obesos, tendo maior risco, quando adultos de terem problemas de saúde, como doenças cardíacas e vasculares, diabetes tipo 2, acidente vascular cerebral, vários tipos de câncer e osteoartrite. Ainda, sobrepeso e obesidade estão associados ao risco aumentado de vários tipos de câncer, tais como câncer de mama (que também pode ocorrer no sexo masculino), colón, esôfago, pâncreas e outros.

Hoje, sabemos que a criança ou adolescente, obeso ou com sobrepeso, tem predisposição para desenvolver diabetes tipo 2. Este era quase que exclusivo de adultos e idosos e obesos. O significativo aumento do número de casos na população torna este tema bastante relevante, uma vez que a doença é insidiosa, “traiçoeira”; com consequências extremamente desastrosas para o paciente que não faz um bom controle (cegueira, perda da sensibilidade das extremidades, amputações, enfarte, …, óbito).

A gordura pode se distribuir uniformemente no tecido subcutâneo, envolvendo todo o corpo, ou “a gordura má”, ao redor da cintura, que é um dos componentes da alteração metabólica (Fig.2).

Uma das consequências: o diabetes tipo 2

Segundo a American diabetes Association, em 2050, 1 em cada 3 pessoas serão diabéticas. Não é alarmismo catalogar a obesidade infantil como epidemia, e desde 2004 se fala em epidemia de diabetes tipo 2, o qual começa quando o corpo desenvolve resistência à insulina, situação na qual embora seja produzida é incapaz de ser efetiva. À medida em que a necessidade de insulina aumenta, o pâncreas gradualmente perde sua habilidade de produzir a quantidade necessária para regular a taxa de açúcar no sangue. A doença era tradicionalmente diagnosticada em adultos de mais de 40 anos, e agora, se observa em crianças, adolescentes e jovens adultos. A epidemia de obesidade e a insuficiência/ausência de atividade física em crianças e adolescentes, assim como a exposição intra-uterina ao diabetes, podem ser grandes fatores de risco no aumento dos diagnósticos de diabetes tipo 2 em crianças e adolescentes, os quais de maneira geral têm entre 10 e 19 anos, são obesos, com importante historia familiar de diabetes tipo 2, e apresentam resistência à insulina.

Por que é difícil detectar o diabetes tipo 2 em crianças?

A dificuldade consiste no fato em que o diabetes tipo 2 pode passar muito tempo sem ser diagnosticado, uma vez que a criança ou adolescente pode não apresentar sintomas ou apresentá-los de forma leve e pouco específica. Em especial, a caracterização do tipo 2 se torna mais complexa em crianças, posto que os critérios de diferenciação entre os 2 tipos de diabetes nestas são menos claros. Quer dizer, a criança com o tipo 2 pode desenvolver a cetoacidose (estado grave de descompensação metabólica, necessitando tratamento hospitalar de urgência) comum no tipo 1; a criança com o tipo 1 pode ter sobrepeso (mais comum no tipo 2), e por causa da prevalência do tipo 1 nesta faixa etária, por vezes dificultando o diagnóstico exato.

Impacto do diabetes 2 em crianças e adolescentes

O diabetes pode levar a uma série de complicações: problemas cardíacos, vasculares periféricos, neuropatia diabética, úlcera, amputações de membros, falência renal, problemas de visão e cegueira. O diabetes também afeta o bem estar psicológico, podendo aumentar os níveis de estresse e levar à depressão. Ainda é difícil precisar como as mudanças hormonais ocorridas no adolescente e pré-adolescente podem afetar o tratamento, da mesma forma que os efeitos colaterais em pacientes mais jovens podem diferir de forma importante em relação aos encontrados em adultos.

O diabetes tipo 2 na criança apresenta problemas que diferem dos adultos com relação à manutenção do tratamento. Como por exemplo, a falta de comprometimento/compreensão da gravidade da situação, por parte do paciente, mudanças de comportamento e padrão de vida constantes que dificultam a leitura de sintomas e mesmo de resultados laboratoriais. Frequente comorbidade como a hipertensão e questões psicossociais mais complexas próprias da idade.

A exposição mais longa a esta condição aumenta de forma importante o risco de complicações, e o diabetes tipo 2 em crianças é considerado mais agressivo, com o aparecimento de complicações mais cedo que diabetes tipo 2 diagnosticado em adultos ou que o diabetes tipo 1 diagnosticado na infância, além do que o índice de morbidade no diabetes tipo 2 maior. O diabético pode ter uma vida completa, e por isso, se costuma usar o termo condição, mas não devemos subestimar as consequências das complicações, que podem aparecer caso o tratamento não seja adequado. E no caso do tipo 2, a importância da prevenção.

Como prevenir /evitar?

Temos que dar maior importância à obesidade infantil, inicialmente prevenir e, se instalada tratá-la pelo seu potencial de gravidade. A prevenção deve ser antes mesmo de o bebê nascer: inicia-se antes da concepção, continua na gestação, e no dia a dia ao longo do crescimento, com adoção de hábitos alimentares e estilo de vida saudáveis. A herança genética não podemos controlar, mas com muito empenho e força de vontade da criança, da família, orientação médica e nutricional, e demais profissionais, acredita-se que esta epidemia seja possa ser revertida.